domingo, 20 de dezembro de 2015

Teimosia



As pernas teimam em não querer obedecer, apesar da teimosia diária. Agora com o frio, substituí as minhas passeatas após o jantar, por uma espécie de caminhada no tapete, mas não é a mesma coisa. E folgo aos fins de semana, mais por falta de vontade do que por falta de tempo.

A minha mulher diz que arrasto demasiado os pés. Também já tinha constatado esse cansaço e a dificuldade em levantar as pernas. 

Empenhei-me numa luta constante para evitar o desenvolvimento da doença. A minha mulher tem sido uma excelente ajuda, embora algumas vezes perca um pouco a paciência. Eu sei que não é fácil para ela. Nem para mim, claro. Nos dias em que os esquecimentos são mais constante, também eu fico desanimado e desiludido comigo mesmo. Tudo tenho feito para o desânimo não se apodere de mim, às vezes com algum sacrifício. Às vezes apetece-me deitar na cama e ficar ali, no escuro, de olhos fechados. Mas continuo a ler, a escrever, a mexer no computador e a encontrar motivação na procura de novas músicas.

Tenho alguma dificuldade em conduzir e sinto essa dificuldade acrescida, na condução nocturna. Estou a perder a minha concentração e só ainda não tive um acidente, porque também não ando depressa. Mas tenho a consciência que não está a ser nada fácil. Por vezes, vejo os carros aparecerem do nada, como se de repente perdessem a sua invisibilidade. Se eu olhar pro lado metade de um segundo, o mais certo é eu ter um carro na fila, parado na minha frente. É como se andasse a conduzir, a fumar e a usar telemóvel ao mesmo tempo.
 
Minha mulher diz que é o Natal que me está a pôr nervoso, pelo facto de ser em minha casa. Mas eu acho que não é nada disso. É a memória a pregar-me partidas, de eu nunca saber onde estão as chaves do carro, de não saber o nome das pessoas amigas ou da porta do frigorífico ficar aberta uma noite inteira.

Uma chatice.

Félix Lamartine