terça-feira, 20 de maio de 2014

Estado de Graça



Tenho a sensação de viver em contínuo Carnaval, já que a minha memória não pára de me pregar partidas. Esqueço, com frequência, do nome dos meus amigos, embora alguns deles eu acabe por me lembrar, mas apenas depois de um esforço, o que leva o seu tempo. Às tantas nem são assim tão amigos.

Duas boas notícias. E ambas vindas do Estados Unidos da América. Às vezes penso que são notícias para alimentar a esperança dos doentes de Alzheimer. A primeira é que está em vias de conclusão, um implante com potencialidade para restaurar memórias, destinada a soldados com danos cerebrais contraídos nas guerra dos Iraque e do Afeganistão e que podem ser extensivas àqueles que estão a perder a memória. A outra refere-se a uma proteína que rejuvenesce o cérebro e os músculos, que também está a ser estudada naquele país. Uma espécie de “proteína” da juventude.

Estas notícias têm o condão de alimentar a esperança. Como venho a dizer desde o início não devemos perdê-la, mesmo que surjam dias menos bons. Engraçado como andamos uma vida a tentar esquecer as más recordações e de repente ouvimos dizer que podemos voltar a senti-las apenas através de uma simples proteína. Se ao menos pudéssemos separar as boas das más memórias…

Sinto que não estou pior. Os últimos tempos têm sido de paz. Continuo a esquecer-me dos nomes daqueles que que não devia esquecer, mas algumas das minhas capacidades não diminuíram. As histórias dos livros que leio continuam a fazer sentido, as personagens não se apagam de um dia para o outro. Continuo a sentir a música como há cinco anos atrás. Continuo a amar as pessoas e as coisas com a mesma intensidade de toda uma vida.

Posso dizer que tenho andado a viver em estado de graça.

Félix Lamartine