Só apareceu no dia seguinte de manhã. Tinha saída de casa, na manhã do dia anterior, não foi almoçar ao restaurante do costume, nem apareceu pelo café que frequentava lá na terra. Foi encontrado por populares, caído e enrolado numa vala, para onde tinha escorregado. Levei-o às urgências do Hospital de Gaia. Meu pai foi atendido muitos minutos depois, a tiritar de frio e de medo. Após alguns exames de rotina, disseram-me que meu pai tinha problemas mentais e que o melhor seria ir a nova consulta no Centro de Saúde Mental, em Vila Nova de Gaia.
Algumas semanas depois foi chamado para consulta no referido Centro de Saúde e o médico não fez mais do que confirmar a demência de meu pai e que pouco havia a fazer a não ser dar-lhe uns comprimidos para refrear uma eventual agressividade e para lhe dar alguma tranquilidade.
Pouco a pouco foi perdendo a memória e a vontade de comer. Às vezes para lhe cortar a barba, pedia que se sentasse numa cadeira e parecia não me entender. Ficava ali parado, os olhos fixos nos meus, sem me responder, como se eu falasse uma outra língua. A partir daí nunca mais lhe ouvi uma palavra.
Faleceu em 1986 com 74 anos.
Félix Lamartine